17
Jun11
[as melhores do serviço de urgência] ou como enfurecer uma pediatra às 10 da manhã...
beijo de mulata
Serviço de Urgência. Fim de semana de manhã. Menino de dois anos com um ar absolutamente miserável e quase desidratado, trazido pela sua mãe, uma senhora produzidíssima, com uma fala afectada e um ar de valha-me-deus-que-não-sei-que-mal-fiz-para-vir-parar-a-esta-espelunca-eu-só-cá-vim-porque-o-motorista-não-sabia-o-caminho-para-o-hospital-da-luz...
Apesar de o menino mal se equilibrar nas pernas, vinha com ele pela mão. Eu nem queria acreditar, mas enfim, ainda lhe dei o benefício da dúvida. Podia ser que a mãe estivesse com uma dor de costas de caixão à cova...
- Bom dia! Então o que se passa com o seu menino?
- Não pára de vomitar desde ontem à noite...
- Vomitou quantas vezes?
- Não sei, Doutora, a ama ficou lá fora. Mas acho que foram muitas.
- Está bem, vamos despi-lo ali na marquesa.
A senhora coloca-o na marquesa e deixa-o ali sentado.
- Vamos despi-lo, mãe.
- ... [Um ar absolutamente em branco, de quem não percebeu o que eu disse.]
- Passa-se alguma coisa? Vamos despir o menino!
- [Um ar abismado!] Mas quer que seja eu a despi-lo?!
- Claro, quem mais?
- Ah...
Enquanto a mãe o despe, claramente mal disposta com um ar de mas-será-que-tenho-de-fazer-tudo-nesta-casa, continuo o meu interrogatório.
- Ele tem estado doente?
- Acho que teve uma amigdalite há tempos.
- Há quanto tempo?
- Mas como é que quer que eu saiba? Já deve ter sido aí há um mês ou três semanas...
- E ele ontem à noite já estava enjoado?
- Não, acho que não...
- O que é que ele comeu ontem ao jantar?
- [Irritadíssima!] Ó Doutora, sei lá! Ele ainda não tem idade p'a comer connosco!
Controlei-me.
- Então pode ir chamar a ama.
Diz-me um colega que estava na sala ao lado:
- Ah, estás a ver aquele menino? Gabo-te a paciência. Ele em tempos foi meu doente e aquela família é indescritível... Calcula que para fazer a primeira sopa de batata e cenoura teve de vir a governanta à consulta!
Apesar de o menino mal se equilibrar nas pernas, vinha com ele pela mão. Eu nem queria acreditar, mas enfim, ainda lhe dei o benefício da dúvida. Podia ser que a mãe estivesse com uma dor de costas de caixão à cova...
- Bom dia! Então o que se passa com o seu menino?
- Não pára de vomitar desde ontem à noite...
- Vomitou quantas vezes?
- Não sei, Doutora, a ama ficou lá fora. Mas acho que foram muitas.
- Está bem, vamos despi-lo ali na marquesa.
A senhora coloca-o na marquesa e deixa-o ali sentado.
- Vamos despi-lo, mãe.
- ... [Um ar absolutamente em branco, de quem não percebeu o que eu disse.]
- Passa-se alguma coisa? Vamos despir o menino!
- [Um ar abismado!] Mas quer que seja eu a despi-lo?!
- Claro, quem mais?
- Ah...
Enquanto a mãe o despe, claramente mal disposta com um ar de mas-será-que-tenho-de-fazer-tudo-nesta-casa, continuo o meu interrogatório.
- Ele tem estado doente?
- Acho que teve uma amigdalite há tempos.
- Há quanto tempo?
- Mas como é que quer que eu saiba? Já deve ter sido aí há um mês ou três semanas...
- E ele ontem à noite já estava enjoado?
- Não, acho que não...
- O que é que ele comeu ontem ao jantar?
- [Irritadíssima!] Ó Doutora, sei lá! Ele ainda não tem idade p'a comer connosco!
Controlei-me.
- Então pode ir chamar a ama.
Diz-me um colega que estava na sala ao lado:
- Ah, estás a ver aquele menino? Gabo-te a paciência. Ele em tempos foi meu doente e aquela família é indescritível... Calcula que para fazer a primeira sopa de batata e cenoura teve de vir a governanta à consulta!