16
Fev12
[casa do gaiato] o centro de saúde
beijo de mulata
(continuando...)
Foi uma experiência apaixonante, trabalhar no Centro de Saúde da Casa do Gaiato com os outros profissionais, que eram pessoas com muito pouca culturamédica ou científica, mas a maior parte deles com experiência clínica e muitobom senso.
E, como se não bastasse ter começado do zero na Medicina Tropical,ainda havia a barreira da língua (o dialecto Changana é absolutamente impenetrável e dificílimo) mas que se resolveu em grande estilo:colocaram à minha disposição uma intérprete fantástica, a Inês de Maria, quepara além de tradutora e mediadora cultural, tinha um sentido de humor e umaboa disposição a toda a prova e adaptava as minhas perguntas desastradas àrealidade local. Ainda hoje sorrio quando me lembro que quando perguntava aosdoentes em que suspeitava de imunodeficiência se alguma vez tinham tidocandidíase orofaríngea e explicava: “assim pequenas placas tipo iogurte”, ela,imperturbável, traduzia iogurte para “coco ralado” ou “mandioca cozida”,traduzia as minhas recomendações de “não fazer esforços” para “não deve pilarmilho nem trabalhar com enxada”... Ou quando comecei a compreender um pouco dodialecto, uma vez uma senhora queixou-se que a filha de sete anos tinha a “dordo mês”.
– Com sete anos já é menstruada? – perguntei,abismada, ainda para mais porque a menina não aparentava sequer ter sete anos,mas apenas cinco ou seis.
– Não, não é menstruada – assegurou-me a Inês, oque ela disse é que a menina tem epilepsia, aqui as pessoas chamam-lhetradicionalmente a “doença do mês” ou a “doença da lua”...
(continua...)