Beijos-de-mulata na Fortaleza da Ilha de Moçambique
Vinca rosea é nome científico desta flor silvestre, acrescentada de vulgar por Lineu. Mas também é o nome de que menos gosto...
Em Moçambique, ela é como o amor dos simples e das mulheres fatais, aparece sem se saber como, explode como se o destino fosse inevitável,
nasce em qualquer degredo, cria-se em qualquer chão*. E também, como o amor dos simples e das mulheres fatais, dependendo de como o tomamos e de quem no-lo dá a beber, tanto pode conter um medicamento como um veneno em potência: em doses certas pode até curar a doença mais grave, mas em excesso mata mesmo, sem apelo nem agravo. E por isso, em Moçambique, tem nome de mistério e nome de feitiço,
beijo-de-mulata...
No Brasil, esta flor é como o amor dos devassos, não pede licença para crescer por toda a parte, nasce em qualquer degredo, cria-se em qualquer chão. E como não escolhe os terrenos por onde cresce e não pede permissão para se reproduzir desenfreadamente, o seu nome é
maria-sem-vergonha.
Em Portugal, é como o amor das mães, nasce em qualquer degredo, cria-se em qualquer chão… cresce por entre as pedras da calçada, qualquer lajedo a aceita, galga terrenos, sobe montanhas, apazigua quem a contempla. É como o amor que nos aconchega a colcha e nos sussurra baixinho "gosto de ti". É como o amor que nos mordisca a orelha esquerda e nos deseja um terno
boa-noite. [Ah, o mordiscar da orelha esquerda não faz parte do amor de mãe? Tudo bem, mas faz parte do boa-noite... Bem, era o meu lado brasileiro de maria-sem-vergonha a falar...]
* Verso de Miguel Torga