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Beijo de Mulata

Beijo de Mulata

31
Mar10

[alhos e blogalhos] valha-me nossa senhora do google

beijo de mulata
Continuam a chegar a este blog inúmeras pessoas em busca incessante por "mulatas selvagens", o que muito me constrange, uma vez que nada tenho a oferecer a estes navegantes exploradores da blogosfera lusófona... Daí que, em desagravo, tenha actualizado o meu perfil, explicitando que "beijo de mulata" é uma flor silvestre e confessando que a suposta mulata do beijo, autora deste blog, afinal é loira caucasiana, portuguesa de gema e pouco dada a actividades públicas conotadas com a pesquisa em epígrafe. Será que chega? (Ou será que este post vai ainda atrair o mesmo tipo de exploradores com maior propriedade e valor mais elevado de prioridade na pesquisa do google?)
31
Mar10

[improbabilidades] nomes que dizem tudo

beijo de mulata
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No Hospital de Iapala começava sempre por perguntar aos pais de cada criança, "Nsina nawo mwana?" (Como se chama o seu menino?) E naqueles dias vi desfilar diante de mim, pintadas de preto e em ponto pequeno quase todas as personagens do Antigo Testamento, Ananias, Malaquias, Levítico, Judite, Ozias... Outras tinham nomes próprios como Trinta, Malária, Quietinha, Castelo, Apressado, Médico, Fresquinha, que me faziam sorrir. Há certos nomes que nos entreabrem intimidades distantes e nos permitem, deliciosamente, penetrar em qualquer coisa de interdito nas fantasias e sonhos alheios...
29
Mar10

[improbabilidades médicas] epilepsia reflexa

beijo de mulata
Esta tarde, estava eu pela segunda vez na consulta de Neurologia com uma adolescente de 15 anos chamada Érica Vanessa* que vinha referenciada do Centro de Saúde por suspeita de crises epilépticas desencadeadas por situações bizarras... Mais uma, pensei... daquelas que vêm em trânsito para a Pedopsiquiatria, só para excluir definitivamente uma doença orgânica e que têm alta quase directamente para o divã dos psis. Aliás, estava-se mesmo a ver desde o princípio que este nome improvável não augurava nada de bom.

E então de que mal padecia a menina? A pobre criatura desmaiava em cima da mesa da cozinha quase todas as manhãs à hora do pequeno-almoço, sobretudo em dias de testes (ah...) e, mais bizarro ainda, desmaiava frequentemente ao telefone quando a mãe lhe pedia para chamar um taxi para levar o pai ao aeroporto quando este ia viajar em trabalho - era um homem de negócios, muito ligado à filha, que viajava frequentemente (um ah maior de admiração...).

Mas quando fomos fazer uma prova de sugestão, que é um procedimento altamente científico ;), em que injectamos soro fisiológico na veia e lhes mentimos com quantos dentes temos dizendo que o soro é um medicamento para provocar crises, porque só assim podemos saber o tipo de crises que elas têm, ela não teve crise nenhuma.. Estranho... geralmente caem que nem umas patinhas... E se olhássemos bem para o electroencefalograma, ela tinha alguns focos de epilepsia...

E então, depois de muito pensar, depois de muito investigar, o que é que tinha a menina? Só hoje pudemos confirmar.

No dia da primeira consulta colocámos a hipótese de epilepsia reflexa, que é um tipo muito raro, provocado por estímulos súbitos. Mas quando tentámos desencadear uma crise com barulhos (desde lançar o Simpósio ao chão - e asseguro-vos de que o Simpósio lançado ao chão faz um estrondo desgraçado - até rebentar um balão) também não conseguimos. Até que a mãe se lembrou: "Só se for quando eu fecho a tampa do caixote do lixo... Por acaso até já tinha reparado e pensado nisso, mas parecia-me tão absurdo..."

Mas nós já estávamos por tudo... e, mal acreditando no que estava a dizer, pedi-lhe "Traga, então, o caixote do lixo na próxima consulta." Só por vergonha não acrescentei "... mas não diga a ninguém que fui eu que disse isto." E hoje lá vieram os três à consulta, a mãe, a adolescente e um saco enorme do IKEA com o caixote do lixo lá dentro. E pronto, já não havia nada a fazer senão irmos mesmo as três a morrer de vergonha, com o senhor caixote do lixo, para dentro do laboratório de electroencefalografia. E não é que o raio do som de encerramento da tampa metálica desencadeava mesmo uma crise epiléptica no electroencefalograma?!

Pior ainda foi quando nos lembrámos dos "desmaios" ao telefone quando a menina chamava o táxi. Mas quem pede para trazer um caixote do lixo, também pode ligar para a empresa de táxis para saber qual o estímulo que activava o foco epiléptico, pensei. Meu dito meu feito, lá telefonei a chamar um táxi para o Hospital Dona Estefânia e a senhora pediu-me para aguardar um pouco. Coloquei o telefone em alta voz e, do outro lado da linha, começámos a ouvir a Marcha Turca de Mozart - uma versão orquestral ranhosa e roufenha - e, qual não é o nosso espanto, quando, no segundo movimento, o som da percussão de péssima qualidade fez desencadear uma nova crise epiléptica! Pobre criança, que trauma horrível! Ninguém deveria ser submetido a tamanha tortura... Até eu, se pudesse, teria tido uma crise de epilepsia...

E foi assim que esta miúda de histérica passou a crítica musical apurada! Estamos até a pensar criar uma nova corrente de crítica musical científica com base em electroencefalogramas de crianças com epilepsia reflexa, que acham?

*Nome obviamente fictício!
28
Mar10

[nocturno africano] as montanhas a arder aqui e ali

beijo de mulata
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No monte negro há constelações de queimadas,
Chamas breves num conciso fogo de estrelas...
Montanhas, ardam-nos sóis, criem luas cheias,
Deves-nos, noite, vários céus de fogueiras!
És montanha, és savana, és África por dentro,
Deves a ti própria ser verde de dia
E de noite arder luz como se a savana
Nunca aparecesse negra à luz mais viva!

a mulata do beijo
28
Mar10

[vozes brancas* #5] desenvolvimento e cultura

beijo de mulata

Um dos aspectos obrigatórios da avaliação do desenvolvimento de uma criança de três anos é se esta já adquiriu a noção de género e se sabe se é menina ou menino. Mas a primeira vez que no hospital de Iapala perguntei a um menino: "Niyuo, muthiana o mulopwana?", ele respondeu-me em Português, com um ar muitíssimo ofendido: "Homem!"

O que poderia querer dizer aquele ar ofendido? Vim a perceber, mas apenas muito depois que, na idade em que as nossas crianças aprendem a dizer que se chamam Ma'ia ou Be'na'do e a dizer com os dedos que têm dois anos, as crianças macuas aprendem se são do sexo masculino ou feminino e a relacionar-se de forma diferente com cada pessoa, consoante o género. Coisa que as nossas só conseguem fazer depois dos três. Em contrapartida, uma criança macua pode chegar à idade adulta sem saber a sua idade ou o nome próprio...

Ingenuidade a minha (é tão triste ser loira, benza-nos Deus), tentar traduzir literal e acriticamente as etapas de desenvolvimento que vêm nos tratados de Pediatria... A verdade é que está escrito em todos os tratados que o desenvolvimento infantil é igual em todas as culturas e que as etapas do desenvolvimento são transversais. Mas é preciso não perceber rigorosamente nada da cultura africana para acreditar nisso!

* Timbre da voz de uma criança antes da puberdade.
28
Mar10

[olavula emakhuwa] falar macua

beijo de mulata

No hospital da Missão...
(Iapala, Nampula)
?
Como poderiam confiar em mim as pessoas em cuja língua as palavras "medicamento" e "veneno" são uma só? Alguém pode censurar estas mães sofridas de me trazerem as crianças já quase em estado terminal, e só depois de terem recorrido aos préstimos de curandeiros e médicos tradicionais? E vêm tantas vezes contra a vontade da restante família, que anuiu apenas ao argumento de "se não há mesmo mais nada a fazer, vamos então ao hospital..."

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